quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

CLASSE MÉDIA SOFRE SIM!


Se vc está lendo esse texto é porque se identificou com o título e, se se identificou, é porque tbm não passa de um assalariado. Portanto, sem aquele papo de coxinhização da nossa amada Classe Média, ou seja, NÓS - por supuesto e nada por acaso, primeira pessoa do plural.

Primeira, tudo que esta classe gostaria de ser. Plural, tudo que ela detesta. Freud explica: primeiro, de primeiro mundo, principal, potência, etc. Plural, de povão, multidão, grupo, romaria e o que mais a língua portuguesa permitir. E seu bom entendimento também.

Eu, que já nasci classe média, desconheço alguma coisa que possuo hoje sem que eu tenha lutado para. Nunca passei fome, claro. Comida na mesa, educação na escola e eu tinha o básico. O resto, fui atrás. Inclusive de sair de casa e me bancar sozinha. Por que todo este prólogo? Porque, colega, eu tenho ÓDIO e inveja da nossa querida elite. Que ciclo após ciclo cria gerações que serão ainda mais milionárias e igualmente insuportáveis. Que vai pra Paulista gritar contra a corrupção, mas sonega impostos. Eu tenho nojo e ódio disso. A inveja é só da grana mesmo.

Por que, né? Fulana (o) que aos 25 anos sabe falar fluentemente alemão, já que a vida toda papai e mamãe bancaram tudo. Inclusive, o aluguel. De qualquer lugar, desde um flat na Avenida Paulista a uma suíte em Paris. Pessoa nunca pegou ônibus na vida, nunca andou a pé até parar no meio-fio porque os sapatos vagabundos fizeram um rasgão no seu calcanhar. Nunca precisou arrumar um emprego de hostess pra pagar a faculdade ou fazer bicos de modelo pra pagar um mísero curso de inglês que, aos 20, ela fala com os pés nas costas. Nunca precisou contar os quilômetros que anda pra perder 500 calorias porque, afinal, ela faz yoga na melhor e mais cara academia da cidade (onde essa espécie se aglomera e se reproduz). Ou, simplesmente, vai à Los Angeles entrar na faca com Dr. Hollywood. Não sabe, enfim, o que é ter de escolher entre pagar uma conta e outra. Papai paga tudo, põe no cash, garçom!

Entendam que meu rancor não é com o fato de ela ser bem-nascida, que culpa tem, né? É melhor até que pegar o Porshe do papai e sair da balada sertaneja bêbada e pronta para atropelar um inocente, como tem sido bem comum em São Paulo nos últimos meses. Porque por mais legítimo e honesto que seja a origem da grana do papy, eu detesto que isso seja num país onde um garoto passa mal na rua porque está há 2 dias sem comer. Onde homens são convertidos em mendigos desde que lembram. Onde a miséria é um fantasma. Desculpa se isso pra vc é normal.

Pelo caminho mais cômodo, pode chamar de preconceito ou de ódio gratuito. Pelo caminho mais controverso, pode chamar de injusto. “Faz parte da realidade capitalista, de castas, de desigualdades”. É, faz parte que toda essa riqueza seja tão cruelmente distribuída mesmo.

Eu nunca quis ser rica e ganhar milhões de dinheiros. Eu só quero ser digna e, se eu quiser falar inglês, alemão ou francês, que isso não me custe os olhos da cara. Se eu quiser ter uma graduação ou pós, que eu não precise vender um rim. Será que tô sendo ingênua? Será que é pedir muito?

Hoje fui para uma entrevista de emprego no Shopping Cidade Jardim. Depois de uma viagem homérica pra chegar ao recinto, notei que NÃO HÁ entrada para pedestres no shopping. Tipo, não há mesmo. Só entram funcionários (pela porta dos fundos) ou quem tem carro. Na boa? Um dia vou entrar naquela pocilga com um Fusca caindo os pedaços. Quero ver se me barram. É estarrecedor, sério.

Aí vc entra no Shopping, um mundo maravilhoso se abre diante dos seus olhos. Cidade Jardim, do aramaico: “Jardins Suspensos da Babilônia de Nabucodonosor.”  Tudo incrivelmente limpo e pasteurizado. Não, higienizado, melhor dizendo. Prevenidos dos Dálits lá fora, que só podem entrar se um dia tiverem um carro de luxo, ou seja, NUNCA.

Aí fui passeando e vi um casal sentado na mesa de um restaurante em cuja imensa janela de vidro dava pra ver todo o bucolismo de uma São Paulo chuvosa, ô Terra da Garoa, poético quase. Enquanto o trânsito e o caos comiam soltos no mundo real. Uma catarse utópica pra vc criar seu limbo perfeito e fingir ser Maria Schneider e Marlon Brando em O Último Tango em Paris.

E logo eu, que adoro fugas e evasões de todos os tipos, faço coro com Gil quando ele diz: “vamos fugir deste lugar, Baby!”. Vamos fugir daquela fuga, daquela Babilônia luxuosa e asséptica, seca de emoções, viva de sonhos fabricados e empacotados numa caixinha de Natal.

Divaguei bastante só pra dizer que eu sou Classe Média e tenho sim, minhas ambições e pretensões, mas ao contrário dos coxinhas que representam o grupo, meus anseios não excluem o direito de qualquer cidadão de comer e bem vestir. De dividir o mesmo pão, a mesma casta que eu.

Ingenuidade? Pode ser. Eu só queria que o mundo fosse rico, mas fosse NOSSO, de nós. Primeira pessoa do plural. 

5 comentários:

Hertha disse...

Oi, Ludmila e Flavis!
Não apenas gostei como me identifiquei com essa análise sobre o que é ser classe média!
Entendo também a inveja que rola com os que nasceram em berço de ouro incrustado com diamantes e lá permanecem, com aquele pavor de sequer tocar um dedinho do pé no solo habitado pela plebe - que, quando não é colocada em um papel de indiferença, é posta em outro bem pior: de sujeição...
É ... Quantas vezes nos bate a aflição de não saber se teremos um bom emprego (bom no sentido de ser suficiente para prover alimentação, estudo, saúde e lazer dignos), se com nossa capacidade e vontade (apenas) conseguiremos nos destacar na multidão e fazer a diferença de alguma forma ... Ô questõezinhas que nos consomem dia após dias...

Mas a coisa consegue ficar pior, já que é importante também que lembremos dos que são bem menos favorecidos que nós: imagina qual o sentimento deles em relação a todas as classes economicamente acima deles? a “classe merda” – dizem alguns – talvez com aquela mesma inveja branca que sentimos dos que nos olham do alto, com aquele ar de realeza ...

No fim das conta, cada classe caminha como pode, né? Uns vão de scarpins de grife, outros descalços, tem um pessoal que está muito desnutrido para sequer caminhar e nós vamos com aquele velho sapato surrado, mas sempre adiante ...

Beijo grande pra vocês!

Hertha disse...

*fim das contas
:)

Anônimo disse...

Daí você fica bravo quando assiste aquele videozinho da festa de quinze anos da tal Anne Stephany Onassis Carollynne e te acham exagerado, babaca, neocomunista.

Tipo, é justo que gaste uma montanha de dinheiro numa festa daquelas alguém que tenha ao alcance da mão uma montanha de montanhas de dinheiro. Sim, é inegavelmente justo.

O que não dá pra engolir (e o resto do mundo aparentemente engole, o dia inteiro) é que 99% desse povo CERUMANO que caminha pela Terra derrame todo o suor de uma vida pra, no limite, bancar os excessos desse abonado 1% que veio ao mundo a passeio.

Vivemos uma mentira: "Get Rich or Die Trying" é o mote do negão 50 Cent, rapper que chegou lá. E quem não chega? Deve morrer tentando, almejando migalhas, sustentando a "mão invisível do mercado"? Como ratos num labirinto, hamsters numa roda que não sai do lugar?

ISA disse...

Hertinha,

que bom que vc se identificou! Mas não, minha inveja não é branca, é inveja mesmo, pura e simples. E não consigo caminhar como posso, carregando toda essa minha indignação, Bjo!

==========

Verossimil, obrigada pelo comentário, é isso mesmo. Sinto-me exatamente assim: um rato num labirinto sem saída. Frustrante!!

Babi Suell disse...

"Eu nunca quis ser rica e ganhar milhões de dinheiros. Eu só quero ser digna e, se eu quiser falar inglês, alemão ou francês, que isso não me custe os olhos da cara. Se eu quiser ter uma graduação ou pós, que eu não precise vender um rim. Será que tô sendo ingênua? Será que é pedir muito?"

Pra mim, fechava ai sua ideia! Mas o texto, num todo, é super legítimo no que vc quis dizer. Embora eu tenha uma concepção diferente de desenvolvilmento conceitual para frase "Classe média sofre".
Mas no geral.. compreendendo o que vc quis dizer.. é um [otimo texto.