quinta-feira, 5 de julho de 2012

Panis et circensis


            Dificilmente esse texto cairá no gosto de algum (possível) leitor. É complicado falar mal de futebol sendo do país onde esse esporte é quase uma religião, uma ideologia, uma doença, mesmo. Felizmente, a liberdade de expressão integra o corpo da nossa Constituição Federal, e é disso que vou me valer.
            Não, não gosto de futebol. Nunca gostei. Meu pai até tentou, me levando ao Rei Pelé para ver o pobre Clube de Regatas Brasil em campo, quando eu era pequena. Mas  tudo o que eu conseguia pensar durante as partidas era o quão sem graça era aquele jogo e no quão assustadores meu pai e meus primos, que costumavam ir conosco, ficavam enquanto a bola rolava. Arregalavam os olhos, bradavam os palavrões do mundo todo, xingavam o juiz e sua família inteira. Assim, como se a coitada da mãe do árbitro tivesse culpa.
            Futebol, só em Copa do Mundo. E olhe lá.
            Dia desses me disseram que o discurso de que “futebol aliena” e afins era velho e tacanho. Não, não é. Hoje foi dia de final de campeonato e as consequências do resultado só provam o quanto isso é uma realidade. São quase 2 da manhã e os carros não pararam de buzinar, nem os fogos de explodir, nem a televisão de exibir os melhores lances à exaustão. A cidade de São Paulo simplesmente parou para ver o Corinthians jogar. E a minha, tão infinitamente distante e menor e que possui seus próprios times, não me deixa dormir, agora que o título inédito do clube paulista foi consolidado.
            Digo que futebol aliena porque já vi gente morrer por isso. Ou carregar alguma sequela grave de um embate cujo único tema foi... Futebol. Já vi estádios vandalizados, já vi pais de família tendo ataques cardíacos em pleno estádio, tudo por conta de clubes cujos jogadores e diretoria não estão nem aí para a torcida. Futebol já deixou de ser amor à camisa, sabem. Os jogadores vão e vem como mercadorias, mesmo. E sorte do time que pagar mais.
            Qual a razão de tanta comoção, meu Deus? Podia ser Corinthians, Flamengo ou até meu pobre CRB – não faz diferença. O futebol consegue manter milhares de pessoas alheias à vida real. É clichê, mas se metade desse entusiasmo fosse canalizado para outras coisas, a exemplo de protestos – e até mesmo atitudes concretas para mudar a realidade do país – o Brasil seria uma pátria vencedora.
            Certo estava o argentino que encontrei em Roma quando fiz uma viagem em grupo, no ano de 2010. Ao saber da sua nacionalidade, um dos meus companheiros de viagem, numa atitude que me embaraçou ao extremo, bradou “somos penta e vocês não!”. O sábio senhor apontou para o Coliseu, ali perto, majestoso e cheio de turistas àquela época do ano, e disse simplesmente “pan y circo” antes de dar de ombros e ir embora. Gol.